O Tributário caminha de mãos dadas com o Fiscal. O que esperar para 2023 e quais fatores devem ser observados?
Gostaríamos de apresentar um cenário mais otimista este novo ano que se inicia, mas depois que a classe política abraçou o populismo, parece haver pouco espaço para as mudanças tributárias estruturais tão conhecidas como necessárias.
A sensação é que perdemos uma janela de modernização importante do nosso sistema. As despesas estavam controladas (folha, aposentados e pensionistas) e a arrecadação tem sucessivamente superado os recordes históricos, acima da inflação, segundo os últimos relatórios da Receita Federal.
Um cenário ideal para uma transição segura, estável e civilizada no sistema tributário. Mudanças estruturais exigem, além do envolvimento direto do Presidente da República, de estudos aprofundados, reflexão e debate. A probabilidade de efeitos colaterais não mapeados, como uma queda de arrecadação no curto prazo, é um dos fatores que exigem margem de segurança. Mas a oportunidade parece ter sido desperdiçada.
Nos últimos dois anos, tivemos uma queda significativa de nossa dívida pública – de 90% do PIB para 75%. No mesmo período, a taxa de desemprego saiu de um patamar de 15%, para algo próximo a 8%, segundo dados do Banco Central. O Brasil foi muito beneficiado nos últimos anos pela alta do preço das commodities, nossa principal pauta de exportação.
Os preços praticamente dobraram de 2020 até agora, segundo dados do Instituto Fiscal Independente do Senado. Poderíamos ter nos fortalecido e promovido as mudanças de longo prazo que são tão caras para reduzir o nosso Custo Brasil Tributário.
Mas no meio do caminho havia uma eleição e um processo inflacionário em curso em todo o mundo. Exceto ditadores, não há representantes de esquerda, direita ou centro cuja popularidade resista à inflação. É um efeito econômico complexo que o cidadão mais simples entende melhor – a perda do poder de compra da moeda.
Quando a população sente no bolso, a insatisfação e o desejo de mudança são ampliados. O voto é um dos instrumentos de expressão e se não fossem tantos os esforços de expansão e renúncias fiscais, seguramente teríamos um resultado nas urnas muito diferente do que tivemos, principalmente no Legislativo.
Neste contexto, foram aprovadas algumas medidas que simplesmente enterraram o instituto do Teto dos Gastos e abriram precedentes perigosos na Lei de Responsabilidade Fiscal. Para ficarmos em alguns exemplos:
- PEC dos Precatórios – Emenda Constitucional n.º 113 e 114 de 2021;
- Subsídio a combustíveis e redução do ICMS sobre energia elétrica e telecomunicações – Lei Complementar 194/2022;
- PEC 01/2022 – Ampliação do auxílio Brasil em R$ 200, vale caminhoneiro, taxista, gás, etc;
- Redução do IPI – Decreto 11.158/2022;
- Perse – Lei 14.146/2021;
- Piso da Enfermagem – PLP 44/2022;
- PEC da Transição – nº 32/2022.
Enfim, uma ampliação das despesas assistenciais combinada com renúncia fiscal sem precedentes. Artificialmente reduziram o preço dos serviços administrados, proporcionando um alívio de curto prazo para parte do eleitorado e que foi temporariamente renovado pelo atual governo.
Não podemos ser contra programas que visem a combater a pobreza e a fome. São demandas urgentes e emergenciais que requerem sensibilidade e atenção. Mas não podemos nos esquecer que o futuro não se constrói com assistencialismo, mas com investimentos, segurança jurídica, emprego e renda.
As propostas de reforma tributária hoje conhecidas devem sofrer resistência de diferentes setores. A simplificação do PIS e da Cofins e a tributação de dividendos devem resultar em aumento de carga e resistência do setor de serviços. A desoneração da folha esbarra na limitação fiscal e em termos de custo da máquina pública, estamos entre os que mais contribuem.
Em relação aos nossos pares internacionais – Rússia (30%), Índia (17%), China (25%), México (13%) e Argentina (29%) –, o Brasil já possui uma carga tributária significativamente mais elevada (34% do PIB). Projetos que visem ampliar o peso dos tributos tendem a ser rejeitados ou gerar efeitos colaterais negativos – ampliação da informalidade, perda de competitividade e até perda de arrecadação.
A União, os Estados e por derivação, os Municípios estão mais frágeis. Se a economia não performar bem em 2023, como as previsões já sinalizam, podemos ter um quadro de deterioração fiscal acelerado. Isso certamente vai impor maior pressão sobre os órgãos fazendários e causar muita dor de cabeça para os contribuintes que já honram suas obrigações.
Há estudos que apontam que uma reforma tributária que simplifique o sistema poderia promover um crescimento do PIB do país em 20%. Haveria uma melhora significativa dos níveis de renda e bem estar para as famílias. Mas a opção foi por um caminho menos nobre.
Enfim, devemos sempre esperar o melhor e com certeza todos sairiam ganhando com uma reforma tributária ampla. Mas isso não nos isenta de estarmos preparados para um cenário adverso, que nos parece mais provável.
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