O que é ser conservador no tributário?

Muitas empresas costumam dizer que são conservadoras no campo tributário, pois não querem ter problemas com o Fisco. E isso parece ser legítimo e correto, desde que o sistema proporcione esta opção. Não parece ser muito o nosso caso.  

O que vemos hoje é que a organização fiscal e tributária não confere clareza quanto aos procedimentos, o que é ou não exatamente devido ou de qual interpretação é correta em uma apuração tributária. Só para ilustrar, basta pensarmos no regime de não cumulatividade de PIS e Cofins.

O que é relevante ou essencial para uma operação? Quais insumos ou despesas conferem direito a crédito? E se aplicarmos o princípio da subtração, conseguimos chegar a uma resposta segura?

Pode até ser que você conclua que um determinado insumo é essencial e já faça o desconto de créditos de PIS e Cofins sobre ele. Mas também devemos entender que a Receita Federal pode não concordar. E neste caso, é esperada a abertura de uma fiscalização e uma possível autuação.

Mesmo amparado por pareceres, precedentes e uma série de estudos e laudos, o risco está sempre presente – é o Custo Brasil Tributário. Esses documentos podem até proporcionar um norte, um conforto, mas raramente eliminam incertezas.

Mas há formas de pensar e agir que podem lhe garantir maior segurança e uma certa previsibilidade na operação, ainda que o ambiente seja conturbado.

No campo administrativo tributário, o primeiro ponto é compreender  que, aos olhos da Receita, sempre é possível uma interpretação mais restritiva. Ainda que tenhamos a melhor intenção de acertar, é esperada uma interpretação diferente pelos órgãos de arrecadação, seguindo com um despacho decisório ou um auto de infração.

A partir disso, temos que ficar atentos aos prazos e preparar a documentação necessária para a defesa administrativa. Com isso em mãos, é possível suspender a exigibilidade do débito e ganhar tempo para uma avaliação mais cuidadosa dos riscos e procedimentos.

Contudo, o mais importante foi feito. A empresa continuará com sua atividade operacional e o processo tributário correrá em paralelo, sem grandes traumas ou riscos não identificados. 

Em muitos casos os contribuintes vencem as discussões, afastando em definitivo a exigibilidade do crédito e confirmando a correção do seu procedimento, seja na via administrativa ou judicial. Porém, se o crédito for realmente devido, há sempre uma possibilidade de parcelamento ou mesmo uma transação tributária. E fica o aprendizado sobre mais um ponto.

Já no campo judicial tributário, há uma série de medidas de fato conservadoras. A primeira delas é mapear as oportunidades hoje não questionadas. Este é o primeiro passo para o conservadorismo. Depois, dentre as selecionadas, separar as que estão afetadas pela repercussão geral ou pela sistemática dos recursos repetitivos.

E a partir dessa triagem, iniciar as discussões, via mandado de segurança. Só isso já afasta o risco de uma eventual modulação de efeitos e todo o prejuízo que o instituto pode proporcionar aos contribuintes que não se anteciparam. Junto às defesas administrativas, os mandados de segurança são os instrumentos mais essenciais para um contribuinte conservador, mas não conformado com a complexidade do sistema e a alta carga tributária.

Ser conservador no tributário é ser diligente, é estar atento e escolher as estratégias corretas para cada situação. Muitas vezes erramos por omissão e os custos podem ser desastrosos para o resultado e os planos de expansão de uma empresa. 

Neste mês, destacamos duas teses para avaliação já com sinais bastante positivos no Superior Tribunal de Justiça (STJ). 

  1. A possibilidade de dedução do IRPJ e da CSLL de Juros sobre Capital Próprio distribuídos de forma retroativa. 
  2. A exclusão do ICMS-ST da base de cálculo do PIS e da Cofins. 

Abaixo seguem mais detalhes sobre cada uma das teses.

Juros sobre capital próprio (JCP) pagos de maneira “retroativa”  – Possibilidade de dedução da base do IRPJ e da CSLL

A legislação em vigor prevê a possibilidade de remuneração dos sócios e acionistas da pessoa jurídica mediante pagamento do chamado  “Juros sobre o Capital Próprio” (JCP), e dispõe que os valores pagos a título de “JCP” podem ser deduzidos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL devidos no período de apuração do lucro real.

Ainda que o pagamento do “JCP” não seja realizado em determinado exercício (por insuficiência de caixa, por exemplo) existe a possibilidade de pagamento nos períodos subsequentes àqueles em que foram calculados, ou seja, é possível pagar “JCP” de maneira retroativa.  

Ocorre que, para fins fiscais, o entendimento da  Receita Federal , é de que o JCP pago de maneira “retroativa” (relativo a períodos de apuração anteriores), por representar uma despesa financeira, não pode ser deduzido da base do IRPJ e da CSLL no período de apuração da data do pagamento, mas somente no período de apuração ao qual se refere (pretérito), em obediência ao “regime de competência”. 

Essa orientação está prevista na  Instrução Normativa n.º 11 de 1996 e, vale dizer, não possui fundamento legal na Lei n. 9.249/95, que dispõe sobre o IRPJ e CSLL e instituiu o JCP. Justamente em função da ilegalidade do entendimento restritivo da Receita Federal (entre outros argumentos), é que o STJ já se pronunciou – nas duas turmas que julgam matéria tributária e seguido por outros tribunais – no sentido de afastar o entendimento restritivo da Receita Federal e admitir a dedução do JCP pago de maneira “retroativa” da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Exclusão do ICMS-ST da BC do PIS e da Cofins

Atacadistas e varejistas das cadeias de fornecimento de autopeças, perfumaria, higiene pessoal, produtos de limpeza, eletrônicos, eletrodomésticos, bebidas, cigarros, combustíveis, lubrificantes, medicamentos entre outros, na qualidade de “substituídos” tributários, podem pleitear a exclusão do ICMS-ST embutido no preço da mercadoria adquirida da base de cálculo do PIS e da Cofins incidente na receita de vendas.

No papel de substituídos, o ônus financeiro da Substituição Tributária é suportado na aquisição de produtos para revenda. Logo, na operação de saída, esse custo é repassado no preço, mas não deveria ser considerado como faturamento ou receita, pois trata-se de valor relativo a tributo que foi recolhido antecipadamente pelo fornecedor da mercadoria.

O STF tem entendimento consolidado de que o ICMS não representa faturamento das empresas, tendo fixado a seguinte tese: “O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”. 

O mesmo raciocínio da chamada “tese do século” pode ser aplicado para o ICMS-ST, tema que começou a ser julgado no dia 23.11.2022, afetado pelo rito de recursos repetitivos no STJ, e que conta com voto do Relator (Ministro Gurgel de Faria) favorável aos contribuintes. Um pedido subsidiário é o desconto créditos de PIS e Cofins sobre o ICMS-ST.

Daniel Ávila

Um forte abraço,

Daniel Ávila

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Custo Brasil Tributário, JCP, Mandado de segurança, PIS e Cofins